Pål Sverre Hagen como Thor Heyerdahl, no filme Kon Tiki.
Depois de ter sido indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2012 (perdeu para Amor, de Michael Haneke), A Aventura de Kon Tiki passou quase despercebido por aqui. Uma injustiça, pois se trata de um filmão da dupla Joachim Rønning e Espen Sandberg. O filme narra a grande aventura vivida pelo explorador norueguês Thor Heyerdahl em 1947, ao construir uma balsa e atravessar o Pacífico, com o intuito de provar a sua teoria de que povos da América do Sul podem ter viajado até a Polinésia e lá se estabelecido, contrariando a afirmação de todos os historiadores e antropólogos, que diziam que a região foi povoada por povos vindos da Ásia.
Thor Heyerdahl, tentando convencer a comunidade científica da sua tese.
Sem nenhum apoio da comunidade científica internacional, Thor decide obter financiamento por conta própria para o seu projeto e arregimenta uma tripulação de cinco camaradas, sem nenhuma experiência no mar (o próprio Thor Heyerdahl sequer sabia nadar). Mas, se os resultados acadêmicos foram pífios, a fama do então jovem cientista norueguês foi às alturas, pois o documentário realizado com imagens da travessia ganhou o Oscar e o livro que ele escreveu sobre a aventura vendeu milhões de cópias no mundo inteiro. Subitamente, Heyerdahl foi alçado à condição de celebridade, lançando um estilo de documentário científico que faria, alguns anos depois, a fama do francês Jacques Cousteau.
Para dar alguma dimensão ao homem, o filme inicia nas ilhas Marquesas, onde Thor Heyerdahl e sua primeira esposa, Liv, viveram isolados do mundo por um ano inteiro. No Museu Kon Tiki, há inúmeras fotos dessa estada do jovem casal. Quando a pediu em casamento, ele perguntou se ela gostaria de "viver de volta no paraíso, como Adão e Eva".
Na Noruega, a aventura de Thor Heyerdahl tem tamanha importância que existe na cidade de Oslo o Museu Kon Tiki, feito quando ele ainda era vivo, que conta com réplicas dos barcos em que ele viajou e detalha em várias línguas e suporte midiático a vida deste mito nacional.
Cena impressionante da baleia assassina que ronda a balsa. Essa baleia está representada também no museu Kon Tiki. Todos os animais e peixes que aparecem no filme são digitalizados, exceto a arara Lorita.
A dupla de diretores noruegueses Joachim Roenning e Espen Sandberg que tem uma sólida carreira na publicidade e em Hollywood, ficou encarregada do projeto que resultou em um filme belíssimo, com uma exata mistura de elementos líricos e documentais, tal como o projeto pareceu à época do seu lançamento. Os 101 dias da travessia do Kon Tiki do Peru até a Polinésia são narrados com a dose certa de emoção e ação.
O único senão do filme é a figura do próprio Thor Heyerdahl, intepretado pelo norueguês Pål Sverre Hagen, menos pela atuação de Hagen do que pelo roteiro, que não explora a fundo as ambivalências de Thor, deixando-nos sempre na dúvida se ele era de fato um cientista obcecado ou um egocêntrico megalomaníaco. Talvez seja ainda difícil para os noruegueses revirarem um mito nacional pelo avesso, quando é muito mais tentador o caminho de glorificá-lo. A contribuição de Pål Sverre Hagen para o personagem - além da incrível semelhança com Thor Heyerdahl - é a reunião de uma força de vontade surpreendente, em maneiras dóceis e elegantes, resultando na carismática figura que o original certamente era no início da sua vida, capaz de reunir cinco pessoas para uma missão suicida, com a alegria de quem vai curtir um cruzeiro nas Bahamas.
Cena da tripulação do Kon Tiki deixando Callao, no Peru (de terno!).
Foram rodadas duas versões para todas as cenas: uma em norueguês, para o mercado escandinavo, e outra em inglês, para o mercado externo. Eu vi a segunda, obviamente, mas com certeza vou tentar assistir a versão em norueguês, embora o sotaque dos atores seja um charme a mais a ser acrescentado.
Aqui o comentário do Manhattan Connection sobre o filme. Muito bom!