Carlos Drummond de Andrade nos anos 50. Fonte aqui.
"E que mais, vida eterna, me planejas? O que se desatou num só momento não cabe no infinito, e é fuga e vento".
Carlos Drummond de Andrade - trecho de Instante
Hoje é o dia "D", o dia do nosso poeta Carlos Drummond de Andrade que muito merecidamente recebe homenagens por todo o país, no seu 110º aniversário. Já expliquei em um post anterior minha admiração tão grande pelo poeta, que fez com que eu escrevesse inúmeras cartas endereçadas a ele quando era vivo e jamais postadas, por julgar aquém do interesse do receptor.
Não deixaria, portanto, de lhe prestar esta homenagem agora que infelizmente ele não poderá mais recebê-la, mas pela sua memória, pela sua obra, pela humanidade que há nela. Hoje mesmo pela manhã, Carlos Heitor Cony deu um lindo depoimento sobre Drummond na rádio CBN, já que ambos foram vizinhos e amigos. E concluiu, chamando a atenção para o fato de que Drummond foi um grande pensador, antes de mais nada. Por exemplo, a frase "no meio do caminho tem uma pedra" é uma grande reflexão sobre a vida, antes de ser poesia. Nesse ponto, concordo com Cony, muitas poesias do Drummond são verdadeiros ensaios.
Drummond com a esposa Dolores e a filha, Julieta. Estadão.
Registro ainda mais um fator para a sua tão ampla popularidade: Drummond é acessível. É o homem que fala das coisas simples da vida, na medida do possível, dentro da sua incrível capacidade de condensação. E cito um trecho de um poema maravilhoso nesse sentido, em que ele se reveste de oráculo que prevê um futuro trivial que, por isso mesmo, é divino (para aqueles saibam "haurir o mel"):
"Desculpe, São João, se meu Apocalipse é revelação de coisas simples na linha do possível. Anuncio uma lâmpada, não sete (e nenhuma trombeta) a clarear o rosto amante: são dois rostos que, se contemplando, um no outro se vêem transmutados. Pressinto uma alegria miudinha, trivial, embelezando em plena via pública o passante mais feio, mais deserto de bens interiores. Profetizo manhãs para os que saibam haurir o mel, a flor, a cor do céu".
Carlos Drummond de Andrade, trecho de Visões, de Antologia Poética organizada pelo autor (Record, 2006)
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