Chiara Mastroianni: desconfio que quando ela nasceu, três fadas gordinhas debruçaram-se sobre o berço e sacudiram a varinha de condão presenteando-a com dotes. Foto de divulgação do filme Les Bien-aimés (Os Bem-amados) , site Allocine.
O seu pai era uma instituição da Itália. A sua mãe é uma instituição da França. Do feliz encontro entre esses dois monumentos do cinema mundial, nasceu Chiara Mastroianni que, ao que parece, sofreu muitos anos a "síndrome do filho de famoso" (e que fama!). Apesar da beleza exótica, simpatia e talento, Chiara relegou-se a papéis secundários por muito tempo. Perto de completar 40 anos, a cara atriz põe finalmente suas manguinhas de fora e começa a aparecer em papéis de maior destaque.
No filme Les bien-aimés, de Christophe Honoré, Chiara faz o papel de Véra, filha de Madeleine, personagem de Catherine Deneuve. O filme tem ainda Ludivine Sagnier, como Madeleine jovem, o queridinho do cinema francês Louis Garrel e o diretor tcheco Milos Forman, no papel de Jaromil, entre outros.
Nesta entrevista concedida a Olivier De Bruyn para o portal francês de cultura Evene em ocasião do lançamento do filme na França (sabe-se lá quando vai aparecer por aqui), ela diz "não tenho medo de Catherine Deneuve". Aqui neste link está a entrevista original em francês. E abaixo, minha tradução livre dela para os não-francófonos (é livre, mesmo ok? perdoem-me de antemão).
Nesta foto, Marcello Mastroianni de peruca Chiara Mastroianni, que nasceu morena como a mãe (sim, Catherine tinha os cabelos escuros quando jovem). Fonte: PurePeople.
Les bien-aimés é o seu quarto filme com Christophe Honoré. Por que esta fidelidade?
Esse rapaz é meu calcanhar de Aquiles...Christophe é ousado tanto na sua vida quanto nos seus filmes e eu adoro isso. Quando, em 2006, recebi o roteiro de Canções de amor, eu disse para mim mesma que era preciso ser corajoso pra caramba para escrever um musical com tanta violência. Tive a intuição de que esse rapaz deveria ser diferente das outras pessoas e não me decepcionei. Depois, em Não minha filha, você não irá dançar, gostei muito que o roteiro fosse não consensual. Houve reações violentas. Muitas mulheres não aceitavam esse personagem nada amável, que não vivia "saudavelmente" sua condição de mãe.
Catherine e Chiara em cena de Les bien-aimés. Fonte Allocine.
Christophe escreveu Les bien-aimés pensando em você?
Sim, e isso me deixava sob uma pressão horrorosa, eu tinha pavor de ser um fracasso. Eu sou ansiosa por natureza, tímida, do tipo que passa despercebida. Depois de Não, minha filha..., ele me disse que ele iria pegar um ano sabático para escrever um livro e fazer teatro. Eu tinha sérias dúvidas. Christophe tem uma impaciência saudável com relação às coisas, ele não pára quieto. Eu estava certa: três meses depois, ele chegou com um primeiro texto do que iria se tornar Les bien-aimés, um projeto de comédia musical que acontece durante meio século. Ele queria me dar um papel com uma forma de leveza depois de Não, minha filha... no qual minha participação era muito mais sombria. Nesse ponto há um tremendo contraste. A prova: a primeira cena em que eu apareço estou dançando!
Milos Forman, Catherine e Chiara, em Les bien-aimés. Fonte: Allocine.
Seu personagem Véra é entretanto muito ambíguo.
Como sempre acontece com Christophe, os personagens não são uma coisa só. Véra tem uma relação complicada com o pai, depois, na sua própria vida sentimental ela sofre para se prender a uma só imagem do amor. Em todos os filme de Honoré há essa idéia de reconstrução permanente. As coisas e os seres não são jamais congelados em uma psicologia tranquilizante.
Aqui, criança, com o pai. Catherine e Marcello nunca se casaram (ele foi casado com a mesma mulher a vida toda), mas eles tiveram uma relação que durou alguns anos. No leito de morte dele, estavam Catherine e Chiara. Fonte aqui.
Em Les bien-aimés você atua junto com a sua mãe, Catherine Deneuve e, ainda por cima, encarna a filha dela. Foi uma experiência única?
Tratava-se antes de mais nada de conseguir que o filme fosse bem-sucedido. Nossas questões eram bem prosaicas. Quando tivemos que cantar as duas em uma plataforma de estação de trem - era novembro e fazia aproximadamente 15°C - a gente se perguntava porque apenas os figurantes tinham o direito de usar cachecol e nós, não. Essas coisas de colegas de trabalho! De todo modo, não me angustia estar frente à frente com Catherine Deneuve. É minha mãe: não temo o ícone intimidador.
Les bien-aimés traz uma parte de comédia musical. É um gênero do qual você gosta?
Sim, eu amo infinitamente a música. No cinema, O mágico de Oz ou Um americano em Paris foram filmes fundadores. E claro que eu sempre amei Jacques Demy, mesmo se, criança, eu não me dava totalmente conta de que era a minha mãe que trabalhava nesses filmes. Eu não a via, eu via os seus personagens.
Catherine Deneuve e Marcello Mastroianni, no filme Liza (fonte: Allocine). O filme foi lançado em maio de 72, no mês que nasceu Chiara.
No que concerne a música, você gravou um CD com Benjamin Biolay (Home) quando vocês moravam juntos e foi um verdadeiro sucesso. Vontade de fazer outro?
Fico feliz que você diga isso. Tenho muito orgulho desse CD que, na época, não foi bem recebido. Gostaria muito de fazer outro mas, como você notou, Benjamin é super ocupado entre os seus próprios CDs e o cinema. Mas ele sabe que eu estou por aqui, disponível.
Você não imagina a música sem ele?
Quem sabe? Se um figurão da música desejar gravar um cd com uma menina com voz de pulmão de molusco, vou pensar, mas a priori seria com Benjamin e com mais ninguém.
E no cinema, projetos?
Acabei a filmagem de Americano, o filme de Mathieu Demy, no qual eu interpreto um papel secundário. É um tipo de road-movie, ultra-pessoal...Depois disso, eu não sei o que mais, nem quando, nem como. Mas isso não me perturba, vamos aguardar.
Fim da entrevista.
Aqui, um trailer do filme Les bien-aimés. Já estou com vontade de asssistir, sou aficcionada em musicais!
At last but not least...um agradecimento a Luiz Fernando Destro, que é o representante no Brasil da CzechTourism – Escritório de Turismo da República Tcheca e também presidente da Comissão Europeia de Turismo no Brasil. Foi ele quem solucionou minha dúvida se escreveria tcheco ou checo. Děkuji !
Marcia,
Muito interessante a entrevista, obrigada pela tradução! Fiquei com vontade de assistir, também adoro musicais hehe
Beijos!
Posted by: Sofia | domingo, agosto 28, 2011 at 16:50
Pois é, Sofia, a pena é que mesmo com grandes estrelas muitas vezes esses filmes não têm muito público e só conseguimos assisti-los no DVD. Vamos aguardar.
Bjs.
Posted by: MarciaCL | segunda-feira, agosto 29, 2011 at 16:07