"À la moitié du chemin de la vraie vie, nous étions environnés d'une sombre mélancolie, qu'on exprimée tant de mots railleurs et tristes, dans le café de la jeunesse perdue."
Guy Debord
"Na metade do caminho da vida verdadeira, nós estávamos envoltos por uma melancolia sombria, expressas por tantas palavras de escárnio e tristes, no café da juventudo perdida".
Os franceses têm um orgulho bastante particular sobre três itens da sua cultura: a gastronomia, a moda e literatura. Ganhar o título de "melhor romance" da revista-ícone da literatura daquele país - a Lire - é um mérito equivalente a um brasileiro ganhar o título de melhor jogador da FIFA. Um prestígio descomunal, uma popularidade ímpar, um talento mais que comprovado. Afinal lá, o número de leitores de romances É MAIOR que a torcida do Flamengo!
A minha "Semana Modiano" (que já está virando "Mês Modiano") atrasou tanto que deu tempo não apenas de eu ler aquele livro que estava na minha mesinha de cabeceira desde 2008 - Le Café de la jeunesse perdue (O Café da Juventude Perdida), o penúltimo do Modiano, mas também outros dois: Accident nocturne (Acidente Noturno) e Un cirque passe (Um circo passa).
Pois bem, segundo a premiação anual concedida pela Lire em 2007 e o Leitura das Marias nos informa, o melhor romance do ano traz as marcas modianescas ao cubo: busca da identidade, tentativa de reter o passado, uma espécie de presente opaco, um futuro (transformado em presente da narrativa) desiludido. A incomunicabilidade. Este blog das Marias que falei há pouco traz um dos melhores resumos que eu achei na internet, além de a vantagem de ser em português. Aliás, a Maria Manuel me fez a gentileza de enviar uma dica de site onde comprar a edição portuguesa do livro - o Wook - obrigada, novamente!
O título é retirado de uma frase de Guy Debord que é citada no livro (e no início deste post) e faz parte do roteiro In girum imus nocte et consumimur igni & Crítica da Separação (p. 51). E que, por sua vez, remeteria a uma frase da Divina Comédia de Dante: "No meio do caminho de nossa vida, eu me reencontrava em uma floresta escura pois a vida reta estava perdida".
Para mim, essa é a frase que se lê de fundo nas várias linhas narrativas. O livro fala dessa perda irrecuperável, da separação entre o indivíduo e a sociedade. É certamente um dos romances mais completos de Modiano sobre a incomunicabilidade. Os personagens trocam palavras entre si mas nada dizem, nem uns aos outros, nem a si mesmos. Na verdade, a heroína central, "Louki" ou Jacqueline, ou Louise du Néant (Louise do Vazio) talvez seja a única que perceba este fato de modo muito claro. A separação entre ela e o mundo é inevitável, intransponível. Só resta se atirar neste grande vazio - ou fugir.
Lugar simbólico da fuga, o "Café Condé" traz também um outro aspecto surpreendente: uma certa nostalgia. Nos vários narradores - o livro é contado em primeira pessoa do ponto de vista de diversos personagens - nota-se uma certa visão esperançosa em relação ao passado. Como se nele estivesse a chave de algum fracasso, e que, portanto, ao encontrar esse "ponto zero" da cisão um certo futuro poderia ser possível.
Um livro profundamente atual, apesar de se situar nos anos 60. Tocante e simples como muitos escritos desse autor excepcional.
proposta interessante;)
Posted by: sylvia | sexta-feira, abril 09, 2010 at 09:28