O tema escolhido pelo professor Robert Kopp foi a autobiografia para Rétif de la Bretonne. Autor deixado à margem durante muito tempo, Rétif vem tendo sua obra estudada detalhadamente. Foi tema de um colóquio em maio de 2006 e tem este site dedicado a ele e a sua época.
O autor do ensaio, Robert Kopp, é especialista em literatura do século XIX, em particular, Baudelaire. Ele leciona no departamento de Literatura da Universidade de Bâle, na Suíça. Para ele, Rétif de la Bretonne é - ao lado de Rousseau - um precursor da autobiografia moderna, a partir da sua maior obra, Monsieur Nicolas. A seguir, as linhas gerais do ensaio (em resumo, para quem chega agora):
Autor marginal, Rétif de la Bretonne (1734-1806) não fez parte de nenhuma instituição literária em vida. Ele entrou no rol dos "grandes escritores" há aproximadamente trinta anos. A descoberta de Rétif - que era lembrado antes apenas por alguns escritores bem informados como Balzac ou Baudelaire, - data dos anos 1960. E ela se deu em grande medida ao movimento da "Nova História", em particular aos historiadores do mundo rural.
Primeiro filho de nove de uma segunda união, Rétif nasceu em uma família de camponeses de boa situação financeira e cultos. Em 1740, o pai do escritor compra um domínio na Bretanha. Na escola, ele recebe uma boa instrução e se torna bom latinista, como convinha a um futuro padre (de acordo com os planos paternos). Mas o interesse demasiadamente exagerado pelas moças o faz sair da escola.
Em Mon Calendrier, espécie de complemento a sua autobiografia, Rétif relata o reencontro com centenas de mulheres, além de atribuir a si mesmo a paternidade dos filhos de dezenas delas. À obsessão das ascendências corresponde também à da descendência: gerar, para Rétif, é sobreviver.
Toda a obra de Rétif é diretamente alimentada pela sua vida; ele não faz outra coisa a não ser contar sua história. Mas transforma sem parar a sua existência em romance. Não é a veracidade da lembrança que lhe importa, mas a sua significação.
Em 1755, Rétif parte para Paris e encontra um trabalho na gráfica real do Louvre. Após alguns meses na gráfica, Rétif entra na empresa de Claude Hérissant, depois em Knapen, gráficos da Corte. É a época da sua primeira doença venérea e de sua ligação com Zéphire, jovem prostituta promovida a heroína de virtude em seu livro Monsieur Nicolas. Em 1759, ele vai para Dijon, depois de novo para Auxerre. Ele se casa, volta para Knapen, em Paris, depois muda para Quillau. A família - que se torna cada vez mais numerosa - vive precariamente e é sem dúvida para melhorar de vida que ele começa a escrever nos anos 1760. Ele vai desta maneira aumentar o batalhão do proletariado literário, sempre mais numeroso na segunda metade do XVII século, vivendo da admiração de Rousseau e dos enciclopedistas.
Filósofo esclarecido, provavelmente ateu, Rétif combina inúmeras utopias do seu tempo. Ele quer melhorar o destino das prostitutas que conhece de perto, reformar o teatro, melhorar as condições da mulher e do homem, reformar as leis e mesmo a ortografia.
Suas primeiras obras - La famille vertueuse e Lucile ou le progrés de la vertu - não têm nenhum sucesso. É em 1775, com Le Paysan perverti, que Rétif se torna famoso. Romance ambíguo e transgressor, ele carrega já diversos elementos da vida de Rétif: a relação com o pai, o amor pela irmã, a paixão por um menino da mesma idade. A morte do pai, o incesto, a homossexualidade, estes são tabus impossíveis de serem revelados a não ser pela ficção romanesca.
A obra maior de Rétif é Monsieur Nicolas ou le coeur humain dévoilé, que é para ele o que foram as Confissões para Rousseau e que representa para nós a origem da autobiografia moderna.
Em Rétif, a necessidade de "cativar o leitor" sempre superou a da exatidão histórica. A narrativa histórica é apenas o meio de fazer compreender a verdade deste coração humano que ele se propõe revelar. Ao reinventar a sua vida, ao sonhar a sua vida em voz alta, Rétif, na sua falta de pudor, é talvez mais próximo ainda de nós do que Rousseau.