"Il y a des auteurs originaux dont la moindre hardiesse révolte parce qu'ils n'ont pas d'abord flatté les goûts du public et ne lui ont pas servi les lieux communs auxquels il est habitué".
(Proust, Un Amour de Swann, GF 1987, Paris)
"Há autores originais em que a menor ousadia causa revolta porque não lisonjearam de início os gostos do público e não lhe serviram os lugares-comuns a que estava habituado".
(trad. Mario Quintana)
"The play was a great sucess. The audience was a failure".
Oscar Wilde
A expressão Nouveau Roman foi empregada pela primeira vez pelo crítico Émile Henriot em um artigo do Monde, em 22 de maio de 1957, como uma etiqueta pejorativa, para dar conta dos romances La Jalousie, de Alain Robbe-Grillet e Tropismes, de Nathalie Sarraute. Como já comentei no post anterior, não se tratava de uma escola, ainda que muitos dos precursores estivessem sob a mesma editora, até porque diversos deles não se reconheciam pertencentes a este ou a qualquer outro movimento literário.
Se o Nouveau Roman não era bem acatado até por escritores considerados como "nouveaux romanciers", a recepção ao estilo foi pontuada por reações contrárias. Foi chamado de "anti-romance" por Sartre, de "aliteratura" por Claude Mauriac, de "escola do olhar" por Roland Barthes e ainda de "literatura do objeto" por François Mauriac.
Na essência, o Nouveau Roman contestava o romance tradicional, estilo Balzac. Neste aspecto, foram influenciados por certos romancistas estrangeiros (Kafka, Virginia Woolf), além de escritores franceses, como Stendhal, Céline e Flaubert.
"Flaubert escreveu o nouveau roman de 1860, Proust, o nouveau roman de 1910. O escritor deve aceitar com orgulho carregar a sua época, sabendo que não há obra prima na eternidade, mas apenas obras na história, e que elas só sobrevivem na medida em que deixaram atrás delas o passado e anunciaram o futuro".
Alain Robbe-Grillet
Mas o que chocava tanto no Nouveau Roman? Em primeiro lugar, havia a destruição do personagem tradicional (reflexo de uma confiança excessiva na natureza humana - lembremo-nos que estes escritores viveram na época da Segunda Guerra Mundial, da Paris ocupada, dos campos de concentração). À pintura de caráter, suspeita de transmitir valores ideológicos, o Nouveau Roman irá preferir a exploração do fluxo de consciência. Colocados anonimamente na cena, os personagens evoluem enigmaticamente, solicitando uma participação dedicada do leitor, que irá, aos poucos, construindo a narrativa e o caráter dos personagens à medida que as cenas lhe são descritas.
Para fazer esse tipo de romance, os escritores buscaram inspiração no cinema. Desde os anos 30, os escritores franceses eram atraídos pelo estilo do romance americano. Esta "moda" se desenvolveu até a Segunda Guerra Mundial, quando a admiração em relação aos valores americanos começou a tomar o significado de uma resistência ao ocupante. Esta atração foi rapidamente dirigida para a cultura cinematográfica americana.
"A técnica americana da nova construção cinematográfica influenciará (...) profundamente os jovens romancistas franceses, que irão explorar os processos de montagem e de encadeamento: rupturas, fragmentação, justaposição das cenas, simples filmagem das coisas em plano aberto ou movimentos de câmera aparentemente destituídos de emoção ou de intenção, tratamento simbólico ou fenomenológico do espaço, reviravolta da cronologia".
Roger-Michel Allemand
Por estas razões, os personagens do Nouveau Roman não têm nome ou, às vezes, este é reduzido a iniciais. Em relação à intriga, o Nouveau Roman é a ficção do íntimo. A história contada no romance está subordinada à consciência parceladora de um sujeito.
Um dos pontos em comum entre o discurso cinematográfico e o Nouveau Roman é o caráter extremamente icônico do discurso. Não que estes objetos estejam lá para significar alguma coisa. O significado dos objetos está na superfície mesma da sua forma. A descrição excessiva não é, portanto, um sinal de superficialidade, como afirmaram diversos críticos. Ao contrário, o papel da descrição é de mostrar um objeto sem UMA significação única, mas com diversos desdobramentos possíveis.
"L'homme élégant est descendu de la limousine, il fume une cigarette anglaise. Il regarde la jeune fille au feutre d'homme et aux chaussures d'or. Il vient vers elle lentement. C'est visible, il est intimidé. Il ne sourit pas tout d'abord. Tout d'abord il lui offre une cigarette. Sa main tremble. Il y a cette différence de race, il n'est pas blanc, il doit la surmonter, c'est pourquoi il tremble."
"O homem elegante saiu da limusine, ele fuma um cigarro inglês. Ele observa a menina de chapéu masculino e sapatos dourados. Ele se aproxima dela lentamente. É visível, ele está intimidado. Ele não sorri, a princípio. Primeiro, ele lhe oferece um cigarro. Sua mão treme. Há esta diferença de raça, ele não é branco, ele deve superá-la, é por isso que ele treme".
(Duras, extraît de L'Amant, Éditions de Minuit)
Finalmente, a relação entre os escritores desta geração e o cinema fica bastante evidente pelas suas atividades múltiplas, entre as duas formas de discurso. Além de cinéfilos, diversos romancistas do Nouveau Roman se tornaram cineastas. Samuel Beckett leu muito Eisenstein, Poudovkine e Arnheim. Na sua primeira estada em Paris, ele escreveu uma paródia do Cid (Le Kid), na qual ele faz alusão à Charlie Chaplin. Em Murphy, ele faz alusão à Griffith. Em 63, ele foi convidado a escrever o roteiro de um curta metragem, enquanto um representante do Nouveau Thêatre. O curta chamava-se Film e teve Buster Keaton no papel principal (veja aqui o trailer de Film).
"Elle disait qu'elle revoyait encore le visage./.../
Son nom à lui, elle l'avait oublié. Toi, elle disait. On le lui avait dit encore une fois. Et de nouveau elle, elle l'avait oublié. Après, elle avait préféré taire encore ce nom dans le livre et le laisser pour toujours oublié."
"Ela dizia que revia ainda o rosto./.../O nome dele, ela havia esquecido. Tu, ela dizia. Disseram-lhe (o nome) ainda uma vez. E, de novo, ela, ela o havia esquecido. Depois, ela preferiu calar ainda este nome no livro e deixá-lo para sempre esquecido."
Marguerite Duras, L'Amant de la Chine du Nord, Folio.
Alain Robbe-Grillet e Marguerite Duras se tornaram cineastas. Após escrever o roteiro de L'Année dernière à Marienbad, em 1961, para Alain Resnais, Robbe-Grillet rodará oito longa metragens, enquanto Marguerite Duras fará mais de 15 filmes. Ele fez L'Immortelle (63), Trans-Europ-Express (66), L'Homme qui ment (68), L'Eden et après (71), Glissements progressifs du plaisir (74), Le Jeu avec le feu (75), La Belle capitive (82) e Le Bruit qui rend fou (94).
A filmografia completa de Duras pode ser encontrada aqui.
Nesta foto, estão Marguerite e seu irmão, na Indochina.
Com relação ao filme O Amante, baseado em livro homônimo que recebeu um Goncourt (e cujas imagens estão enriquecendo este post), Marguerite simplesmente não o aprovou. A ponto de escrever um segundo livro, que intitulou L'Amant de la Chine du Nord, dizendo que esse era "o texto daquilo que o filme deveria ter sido", só para mostrar como ela teria feito, no lugar de Jean-Jacques Annaud.
Marcia,
As relações entre o Noveau Roman e o cinema são muito interessantes. Adoro "O Ano Passado em Marienbad", e agora entendo melhor as origens desse tipo de construção de narrativa. Estou aprendendo bastante com seus posts! Beijos!
Posted by: Erika | terça-feira, janeiro 10, 2006 at 18:05